A receita da gigante da
internet para atrair, reter e motivar talentos.
De 2007 pra cá o Google apareceu em todas
as edições da pesquisa “100 melhores empresas para se trabalhar”, da revista
Fortune, sempre entre as quatro melhores colocadas. Em cinco das vezes alcançou
o primeiro lugar. Mas por que os mais de 50 mil funcionários dessa gigante da
internet são tão felizes assim? Seriam os salários?
De fato, a remuneração lá é acima da média
de mercado (um estagiário ganha cerca de 20 mil dólares por 3 meses de
trabalho). Mas esse não é o principal motivo.
O Google sempre encarou o desafio de
atrair, reter e motivar talentos de uma forma, digamos, não convencional.
Um pouco da filosofia da empresa foi
retratado no filme “Os Estagiários” (The Internship), de 2013. Ali, o Googleplex
(como é chamada a sede da companhia, na Califórnia) é o cenário da história dos
quarentões desempregados que conseguem uma vaga de estágio. Quem não viu o
filme pode procurar, no próprio Google.com, por imagens relacionadas ao termo
"Googleplex", e vai ter uma ideia do que são ambientes de
trabalho “não convencionais”.
Os benefícios mais “corriqueiros”, por
assim dizer, são oferecidos pela companhia, como planos de saúde, odontológico
e de aposentadoria, seguro, pacotes de férias e reembolso com despesas de
educação. Mas há aqueles pouco comuns: almoços e jantares preparados por chefs
em restaurantes gourmets e, entre as refeições, lanches, salgadinhos e bebidas.
É muita caloria? Pra não engordar e cuidar
da saúde, há academias de ginástica, aulas de dança e fitness, jogos
(como paintball e laser tag), quadras de vôlei, playground
e médicos que podem ser consultados. Manter a beleza e relaxar é fácil, já que
há cabeleireiros, massagistas, lavanderias, videogames, ingressos para jogos de
beisebol e as confortáveis e futuristas cabines de soneca (procura lá por “Google
sleeping pod”).
Transporte não é problema: há oficinas para
conserto das bicicletas, que são fornecidas pela própria empresa. O dono de
carro pode contar com troca de óleo e lava-rápido. E, se ele quiser comprar um
carro híbrido, ganha uma ajuda de até 5 mil dólares. Para os que vão de ônibus,
há linhas regulares para diversos destinos.
E tudo isso grátis!
Mamães e papais também são bem tratados: as
mamães têm 18 semanas de licença remunerada (a lei americana garante apenas 12
semanas, mas sem qualquer remuneração). Nos três primeiros meses do bebê, os
novos pais recebem 500 dólares de ajuda para alimentação, além de berçário. Os
pais que quiserem adotar têm reembolso de até 5mil dólares para o pagamento das
despesas legais.
Porém, embora extraordinários, esses
benefícios não são considerados o fator mais importante de motivação de
talentos. O segredo, acreditam, está na cultura da empresa, criada em 1998 por
Sergey Brin e Larry Page, colegas de doutorado em Ciências da Computação da
Universidade de Stanford.
Brin e Page pensaram muito além da caixa,
contrariaram o senso comum e criaram uma empresa que não valoriza a ganância e
a competitividade, mas sim um ambiente parecido com um campus universitário,
onde a colaboração e o desejo de mudar o mundo são estimulados. Eles
acreditavam que, para atrair talentos, teriam que oferecer um ambiente onde as
pessoas gostassem de trabalhar, se divertissem e continuassem sonhando, onde
fossem desafiadas e recompensadas por sua dedicação. E, para satisfazer tão
diferentes necessidades teriam que respeitar a diversidade e a individualidade
dos trabalhadores, já que seres humanos não são iguais.
A cultura é tão importante para o Google
que, lá, há o cargo de CCO (Chief Culture Officer), algo como “Diretor
Cultural”, um alto executivo que tem por função definir e reforçar a cultura da
organização. E, como a cultura é de diversão, basicamente o trabalho do CCO é o
de fazer os trabalhadores felizes.
Os fundadores veem a empresa como uma startup
composta por várias startups. O clima de liberdade em que os empregados
trabalham procura estimular o empreendedorismo, sem hierarquia, para
potencializar a criatividade e a inovação.
A organização de trabalho é plana, e não
hierarquizada. Os trabalhadores são divididos em pequenos grupos de trabalho,
pequenas células de empreendedorismo nas quais as ideias fluem e em que há
colaboração. O membro pode mudar de grupo de trabalho sempre que desejar, sem
pedir permissão. O feedback acontece entre colegas de trabalho, e não entre
subordinado e superior, e as ideias dos grupos são reunidas por comitês, que as
lançam ao mercado.
Liberdade, também, é poder escolher a que
horas vai trabalhar, se vai de pijama ou se leva seu cachorro para o escritório.
Além disso, os funcionários podem passar até 20% de seu tempo em seus próprios
projetos. Essa cultura de liberdade e diversão, acreditam os fundadores do
Google, é a responsável por obter comprometimento, criatividade e
produtividade.
Mas, afinal, será que isso tudo dá
resultado? Bem, tem funcionado para o Google que, de janeiro a março de 2014,
faturou 15,4 bilhões de dólares e que, em 2013, foi considerada a segunda marca
mais valiosa do mundo, com valor de mercado de mais de 93 bilhões de dólares (só
perde para a Apple, fundada em 1976).
É fato que o sistema recebe críticas e
não é perfeito – longe disso –, mas é um importante passo numa direção
completamente diferente daquela adotada por uma infinidade de empresas: a de
obter produtividade a qualquer custo, inclusive com prejuízo da saúde mental e
física de funcionários que, desrespeitados, são cada vez mais sobrecarregados
de trabalho e competem (ao invés de colaborarem) para alcançarem metas, bônus,
prêmios e promoções.
Evidentemente, para a esmagadora maioria
das empresas, não dá pra fazer uma fração do que o Google faz por seus
funcionários. O que dá pra fazer, independentemente do tamanho da companhia, é
garantir aos seus colaboradores um ambiente de trabalho em que haja respeito, o
que já é um bom começo!
Frederico E. Fernandes
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