sexta-feira, 30 de outubro de 2020

Arte e a Física Moderna



Os Parâmetros Curriculares Nacionais, nas Orientações Educacionais Complementares (PCN+, 2002), sugerem um ensino onde a Física apresente uma contextualização sociocultural a fim de que o "conhecimento científico e tecnológico seja compreendido como resultado de uma construção humana, inserido num processo histórico e social". Este ensinar Física deve levar ainda à compreensão das formas pelas quais a Física e a tecnologia influenciam nossa interpretação do mundo atual, condicionando formas de pensar e interagir. Por exemplo, como a relatividade ou as ideias quânticas povoam o imaginário e as manifestações culturais contemporânea. É necessário que se compreenda a Física e, de forma geral, qualquer ciência, como parte da cultura.


O texto acima é fragmento do artigo INFLUÊNCIAS DA FÍSICA MODERNA NA OBRA DE SALVADOR DALÍ (Andrade, Nascimento e Germano).

 

Salvador Dali e a Física

Contemporâneo das duas maiores revoluções científicas do início do século XX, a Teoria da Relatividade e a Mecânica Quântica, o pintor espanhol Salvador Dalí (1904-1989) procurou retratar o sentimento vivido pela humanidade daquela época frente às novas formas de ver o mundo. Este trabalho procura revisitar algumas de suas obras a partir de um olhar pedagógico de forma a identificar elementos e ideias relacionados à Física Moderna presentes nas mesmas. Com esta proposta busca-se uma aproximação entre ciência e arte, ressaltando-se o entendimento da ciência como cultura humana, e pretende-se contribuir para um ensino interdisciplinar de Física Moderna no nível médio e na formação de professores.

Em 1929, junta-se em Paris ao grupo surrealista, liderado pelo antigo dadaísta André Breton. Logo, Dalí torna-se um líder do movimento surrealista e
desenvolve o seu método "paranoico-crítico". Sobre este grupo Dalí afirma:
O grupo surrealista era para mim uma espécie de placenta que me nutria e acreditava no surrealismo como nas tábuas da Lei. Assimilava
com um apetite incrível e insaciável toda a letra e o espírito do movimento, que, aliás, correspondia tão exatamente à minha natureza profunda, que cheguei a encará-lo com a maior naturalidade (DALÍ, 1976).

O Surrealismo (segundo uma definição de Apollinaire, em 1917) é uma corrente organizada, mas também produto de uma mentalidade própria da época (ARGAN, 2002). Surge a partir do Dadaísmo, concordando com muitos dos seus pressupostos, principalmente em sua fase inicial, ainda que não tenha ocorrido uma fusão entre estes dois movimentos. Também recebe influências do futurismo italiano e mesmo de correntes irracionalistas do romantismo alemão. Em 1924, o poeta e escritor André Breton (1896-1966) liderou a criação desse novo movimento e escreveu o seu primeiro manifesto. Breton também era médico psiquiatra, estudioso de Freud, cuja teoria do inconsciente abria à pesquisa uma vastíssima região da psique. No inconsciente pensa-se por imagens, e, como a arte formula imagens, é o meio mais adequado para trazer à superfície os conteúdos profundos do inconsciente. Na primeira fase da poética surrealista, definia-se, uma prática artística onde o pensamento deveria ser expresso de maneira livre, espontânea e irracional, externando os impulsos da vida interior, sem exercer sobre ele qualquer controle consciente.
No Manifesto Surrealista, André Breton associa a criação artística ao automatismo psíquico puro:
Surrealismo é o automatismo psíquico puro pelo qual se propõe expressar, verbalmente, por escrito, ou de qualquer outra maneira,
o funcionamento real do pensamento. O pensamento é ditado com ausência de qualquer outro exercício da razão, a margem de toda preocupação com estética ou moral (TELES, 1978).

A persistência da Memória

A Persistência da Memória talvez seja o trabalho de Salvador Dalí mais relacionado à Teoria da Relatividade. (...) Os relógios apresentam-se macios, flexíveis, maleáveis, parecendo fluir pela superfície onde estão postos. A imagem de relógios moles se repete em várias outras pinturas de Dalí, como em Relógios moles (1933), O sonho de Vênus (1939), Relógio mole no momento da primeira explosão. A desintegração da persistência da memória, Raios cósmicos ressuscitando relógios macios (1965) e Relógio macio ferido (1974). Esta fluidez ou maleabilidade dos relógios é relacionada à noção de dilatação do tempo da Teoria da Relatividade Restrita. É importante salientar que a noção de dilatação do tempo na Relatividade Restrita é uma propriedade do espaço-tempo e não um efeito no mecanismo dos relógios. Quem "amolece" é o próprio tempo, e não os relógios. 

 Outras obras de Salvador Dali que fazem referência à Relatividade Restrita ou à Física Quântica

 Relógio mole no momento da primeira explosão. Salvador Dalí (1954).




 Galátea de esferas. Salvador Dalí (1952).

 


 

  

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