terça-feira, 5 de julho de 2011

Humildade - de Cora Coralina


Cora Coralina, uma das principais escritoras brasileiras, publicou seu primeiro livro aos 76 anos de idade.

Mulher simples, doceira de profissão, tendo vivido longe dos grandes centros urbanos, alheia a modismos literários, produziu uma obra poética rica em motivos do cotidiano do interior brasileiro, em particular dos becos e ruas históricas de Goiás.

Filha de Francisco de Paula Lins dos Guimarães Peixoto, desembargador nomeado por D. Pedro II, e de Jacinta Luísa do Couto Brandão, Ana nasceu e foi criada às margens do rio Vermelho, em casa comprada por sua família no século XIX, quando seu avô ainda era uma criança. Estima-se que essa casa foi construída em meados do século XVIII, tendo sido uma das primeiras edificações da antiga Vila Boa de Goiás. Começou a escrever os seus primeiros textos aos quatorze anos de idade, publicando-os nos jornais locais apesar da pouca escolaridade, uma vez que cursou somente as primeiras quatro séries, com Mestra Silvina. Publicou nessa fase, 1910, o conto Tragédia na Roça. Casou-se em 1910 com o advogado Cantídio Tolentino Bretas, com quem se mudou, no ano seguinte, para o interior de São Paulo. Viveria no estado de São Paulo por quarenta e cinco anos, inicialmente nos municípios de Avaré e Jaboticabal, e depois em São Paulo, para onde se mudaria em 1924. Ao chegar à capital, teve que permanecer algumas semanas trancada num hotel em frente à Estação da Luz, uma vez que os revolucionários de 1924 haviam parado a cidade. Em 1930, presenciou a chegada de Getúlio Vargas à esquina da rua Direita com a praça do Patriarca. Um de seus filhos participou da Revolução Constitucionalista de 1932. Com a morte do marido, passou a vender livros. Posteriormente mudou-se para Penápolis, no interior do estado, onde passou a produzir e vender linguiça caseira e banha de porco. Mudou-se em seguida para Andradina, até que, em 1956, retornou para Goiás. Ao completar cinquenta anos de idade, a poetisa relata ter passado por uma profunda transformação interior, a qual definiria mais tarde como “a perda do medo”. Nesta fase, deixou de atender pelo nome de batismo e assumiu o pseudônimo que escolhera para si muitos anos atrás (Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas). Durante esses anos, Cora não deixou de escrever poemas relacionados com a sua história pessoal, com a cidade em que nascera e com ambiente em que fora criada. Ela chegou ainda a gravar um LP declamando algumas de suas poesias. Lançado pela gravadora Paulinas Comep, o disco ainda pode ser encontrado hoje em formato CD. Cora Coralina morreu em Goiânia. A sua casa na Cidade de Goiás foi transformada num museu em homenagem à sua história de vida e produção literária.

Delicie-se com um de seus grandes poemas:

“Humildade

Senhor, fazei com que eu aceite minha pobreza tal como sempre foi.

Que não sinta o que não tenho. Não lamente o que podia ter e se perdeu por caminhos errados e nunca mais voltou.

Dai, Senhor, que minha humildade seja como a chuva desejada caindo mansa, longa noite escura numa terra sedenta e num telhado velho.

Que eu possa agradecer a Vós, minha cama estreita, minhas coisinhas pobres, minha casa de chão, pedras e tábuas remontadas. E ter sempre um feixe de lenha debaixo do meu fogão de taipa, e acender, eu mesma, o fogo alegre da minha casa na manhã de um novo dia que começa.”

Cora Coralina

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